4 de agosto de 2011

Datena diz que estava censurado na Record:


Confira a seguir uma entrevista que A Folha realizou com Datena!

Nos últimos 45 dias, o apresentador José Luiz Datena, 54, trocou de emprego duas vezes e viu seu salário inicial, de R$ 850 mil, cair para menos da metade deste valor. No período, seu programa saiu da Band, entrou na Record e a partir de segunda-feira volta para a Band.

Cercado de boatos e críticas, muitas das quais verbalizadas pelo próprio Datena enquanto esteve no ar na Record, o entra-e-sai causou mal estar nas duas emissoras e deixa um complexo processo jurídico envolvendo duas multas milionárias.

Datena recebeu a Folha na última terça-feira (2). "Evidente que fiquei muito tenso com toda esta movimentação. Quase morri", disse o apresentador, gesticulando seu braço direito ornado com duas pulseiras, de ouro e prata. Na entrevista a seguir, ele explica seus motivos e arremata: "eu era mais feliz quando estava por baixo do que quando fiquei por cima".

Devoto de Nossa Senhora Aparecida, ainda fala sobre assuntos íntimos, como os problemas de saúde e os 12 remédios que tem que tomar diariamente. Leia abaixo.

Folha - Como você enxerga os acontecimentos recentes?
Datena - Talvez por um problema de saúde sério que tive cinco anos atrás (retirada de um tumor benigno no pâncreas), comecei a levar mais a sério a idéia de que o homem tem que ser feliz na vida. Antes eu já tinha problemas de desequilíbrio químico, cheguei a ir ao psiquiatra. Porque eu achava que era louco, que brigo e discuto com todo mundo. Mas ele me disse, "Datenão, você não tem nada de maluco, você é inteligente só que reage de forma exacerbada. Tem que controlar isso".

E você encontrou a felicidade?
Não encontrei o que significa ser feliz. Quando você dá um passo adiante, aparecem mais pessoas trabalhando para que não seja feliz. Por isso que eu gosto daquele ditado que diz, "quanto mais conheço o homem, mais eu gosto do meu cão".

O que aconteceu exatamente?
Havia pessoas que me incomodavam na Band, avisei isso, e não fizeram nada. Então busquei a Record, onde tinha ótimas relações, afinal havia trabalhado lá por oito anos. O bispo Gonçalves (Honorilton Gonçalves, presidente da emissora), que não gosta mais que o chamem de bispo, mas pra mim sempre vai continuar sendo bispo, sempre foi um cara que gostou de mim. E não deixei de gostar dele. Só que hoje ele subiu e fica numa espécie torre de marfim, mandando recados pelo diretor de jornalismo.

Que tipo de recados?
As regras da emissora eram muito impositivas, e pareciam censura. Me puseram de quarentena e proibiram de falar com a imprensa por seis meses. "É que o bispo te acha muito polêmico", disseram. Também me proibiram de fazer críticas à Record no ar. O diretor de jornalismo me ameaçou mencionando o caso do humorista Tom Cavalcante, que teve que pagar uma multa de R$ 100 mil por ter falado mal da emissora para a imprensa. Respondi: eu odeio ameaça. Se tivesse medo não estaria fazendo o programa que faço.

Como terminou este diálogo?
Ele ainda me falou: "poxa, mas você anda muito infeliz no ar". Respondi, por que não contratam o Bozo? Ele vai ser mais feliz que eu. Foi aí que pensei, sobre quais assuntos posso falar? Fiquei confuso. Quando meti o pau no Ricardo Teixeira, ninguém falou nada, porque é interesse deles. Vários fatores não foram cumpridos.

Quais, por exemplo?
Primeiro disseram que o programa seria nacional. Aí depois que não seria. Então no meio do caminho cortaram quase uma hora do programa, e mudaram de horário. Quando cheguei me prometeram uma estrutura global, de um helicóptero em cada cidade, e nada disso aconteceu. Pior, chegaram a cortar matéria ao vivo para não pagar hora extra da equipe. Nunca vi uma coisa dessa.

Na Band a estrutura era melhor?
A Band não pode ser melhor porque a Record é uma emissora grande. Mas veja o caso do Hamilton (piloto de helicóptero). Ele tinha liberdade total na Band, mas na Record começaram a cercear a participação dele. Eles cortaram o barato do Hamilton. "Não usa demais, se não banaliza o cara", era o que me diziam. Mas como, se são as cenas de helicóptero que dão vida ao programa? Outra coisa: quem pagina o jornal normalmente sou eu. Mas na Record, me diziam: "melhor você não paginar, só comentar".

E o ibope?
Depois que mexeram no programa o ibope caiu pra caramba, e comecei a empatar com o SBT. A impressão que eu tenho é que estavam me apagando como uma vela. Guardadas as proporções, é a mesma coisa que você contratar Neymar e falar que não vai poder driblar, dar chapéu, gol de cabeça... Por isso resolvi dar um basta. Os caras que estão lá que se limitem a cumprir as regras. E tem jornalistas de primeira grandeza. Celso Freitas, Marcos Hummel, Ana Paula Padrão e uma equipe que é maravilhosa.

Qual foi a gota d´água?
Quando participei de um quadro do programa "Legendários", do Marcos Mion. Ali tinha um monte de grandes talentos relegados e só levantando plaquinha. Quando conversamos, me disseram que o contrato os prendia. Aí decidi sair.

E as multas?
Eles estão invertendo a bola. Eu que denunciei. Estou cobrando a multa do segundo contrato.

E a multa do primeiro contrato, que estava pendente desde sua primeira passagem pela Record?
Isso que eu acho estranho. O natural seria perdoarem minha multa. Mas disseram que perdoariam apenas se eu cumprisse o segundo contrato. Quem disse que não forçaram a barra para acelerar o processo da primeira multa?

E na sua volta à Band, que ambiente espera encontrar?
Eu não tinha para onde ir, e a Band fez a proposta. A Band só me demonstrou carinho e amizade. Tenho uma enorme gratidão pelo dono, Johnny Saad, que até para o médico já chegou a me levar, e pessoalmente. O interessante é que as pessoas que eu não gostava me acolheram bem, sentiram minha falta. Mas se o ambiente for ruim, largo tudo.

Muitos criticam seu programa e consideram-no violento.
Eu faço um programa que é reacionário, sob um ponto de vista claro mostrando o que acontece na sociedade. Só que meus comentários alguns imbecis não entendem. Sou um cara de formação totalmente de esquerda, li muito na vida, já ganhei inclusive dois prêmios Herzog de direitos humanos.

O que você leu?
Sempre li muito desde moleque, adoro filosofia, e vou tentando deglutir, tudo que tem lá é a base da vida. Leio Schopenhauer, que parece muito comigo, por conta do pessimismo. Mas busco a felicidade do Spinoza. Sou um Schopenhauer tentando
virar Spinoza.

Não existe uma exploração da violência na TV?
E o que não tem violência hoje? O que mostro no meu programa que não é verdade? A matéria-prima quem produz é a sociedade. E não divulgar isso significa omissão. Você só melhora a sociedade mostrando seus podres. De repente hoje em São Paulo há mais proibição que na época da ditadura: não pode fumar, sair de carro, você é obrigado a votar... que porra de democracia é essa?

Onde se situa politicamente?
Bem próximo da anarquia. Mas o que eu gostaria de seguir a essa altura é a social democracia.

Que acha da pena de morte?
Sou visceralmente contra. Com um código penal absurdamente ultrapassado, podem ser cometidas injustiças graves, matando gente inocente. Lembre que estamos em um país e que quem rouba shampoo e pão vai pra prisão, enquanto políticos que metem dinheiro na cueca estão livres.

E a polícia brasileira?
A polícia brasileira, pela minha formação, sempre fui contra, associando-a à ditadura. Mas com o programa, descobri um Brasil que não conhecia. Evidente que a polícia não pode ser a melhor do mundo, porque o salário é miserável. Os que não são corruptos dentro da corporação são verdadeiros heróis. E são maioria.

Como está sua saúde atualmente?
Estou bem. Mas não pratico atividade física e nem faço exames. Que as pessoas não sigam meu exemplo, mas penso que enquanto não for ao hospital, não vou saber o que tenho. E o que passei não quero passar de novo. Fiz uma cirurgia enorme, tirei metade pâncreas e do baço. Isso provocou um aumento de diabetes, mas estou legal. O chato é que hoje tomo 12 remédios ou mais.

Você detonou muito na vida?
Gosto muito de beber, mas parei, agora só moderadamente.

E drogas?
Sou contra descriminalizar a maconha, é uma bobagem. Droga é droga, traficante é traficante. Mas a bebida também é uma droga. Pode ser um contrasenso. Talvez eu votasse pela lei seca. Talvez eu me tornasse muçulmano.

Mais algum recado?
Estou absurdamente bem resolvido. E cagando se as pessoas gostam ou não de mim. Não sou um produto comercial de prateleira.


Fonte: Folha de SP.(Editado)
Foto: Divulgação.

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