< Web Novela de MARCOS SILVÉRIO >
No capítulo anterior...
Beija fica apreensiva ao saber que Motta estava transtornado na festa
Ela conversa com João levantando hipóteses
Motta se explica com Perdizes sobre o ocorrido no baile
O Ouvidor teme sua ex-amante e revela que seu nome é Beija
Perdizes fica atônito com a revelação
CAP. 97
PERDIZES: O nome da sua ex-amante é Beija?
MOTTA: Sim. Por acaso a conhece?
PERDIZES (titubeando): Não... Quer dizer... Não. Não conheço, por quê?
PERDIZES: Preciso encontrá-la e mandá-la de volta para as Minas Gerais. Para São Domingos do Arachá, de onde nunca deveria tê-la tirado.
PERDIZES:
Um instante, Motta. Não estou compreendendo bem as coisas. Quero
explique melhor. O que esta mulher fez para deixá-lo tão rancoroso e
amargo assim?
MOTTA: Você é um amigo de longa data, sei que em ti posso confiar...
PERDIZES: Claro. Nos conhecemos há quantos anos?
Como num flash back, Motta começa a recordar o dia em que conheceu Beija.
MOTTA:
Fui ao arraial de São Domingos dos Araxás, perto de Desemboque,
resolver problemas administrativos. Naquele lugarzinho de chão batido,
me sentia o próprio rei. O povo organizou um baile em minha homenagem.
Tudo estava sem graça e monótono quando adentra o salão a mais bela
jovem que já tinha visto em minha vida. Simples, meiga e sorridente.
Seus lindos olhos azuis faiscavam de encantamento. Daquele momento em
diante, minha noite ganhou cor. Tomei-a em meus braços e bailamos
praticamente a noite toda. Foi amor, ou paixão, sei lá, à primeira
vista. Disse para mim mesmo: quero esta mulher e vou tê-la de qualquer
jeito! Foi aí que cometi o ato mais insano da minha vida...
PERDIZES (admirado): E que ato foi este?
MOTTA:
Ordenei aos meus homens que raptassem a moça. Durante nossa conversa
descobri onde morava, com quem... Tudo teria corrido muito bem não fosse
o seu avô um velho valente. O danado reagiu, de arma em punho, e o meu
capataz, para se defender, passou fogo no velho.
PERDIZES: Meu Deus! Estou chocado!
MOTTA:
Beija nunca me perdoou por isso. O avô era coisa que mais amava na vida
e a única que tinha. Tinha também um noivo, que dizia amar muito, mas
nesse romance nunca botei fé. Ela era virgem e insistia que estavam de
casamento marcado.
PERDIZES: Então você desgraçou com a vida dessa moça?
MOTTA:
Infelizmente sim. Meu desejo me cegou a ponto de cometer os maiores
desatinos. Na ânsia de tê-la comigo meti os pés pelas mãos e me coloquei
numa situação periclitante na presença de Sua Majestade, D. João VI.
Poderia ter tido o meu nome atirado na lama.
PERDIZES: Então foi por isso que intercedeu junto a D. João para que aquele pedaço de Goiás, o triângulo, voltasse a Minas Gerais?
MOTTA:
Exatamente. O governador de Goiás sente um ódio de morte por mim. Se
fosse denunciado e julgado por ele, certamente seria condenado. Já o
governador de Minas é meu amigo do peito, nem sequer me acusaria...
PERDIZES: História complicada essa...
MOTTA:
Mas o pior estava por vir... Nos meses seguintes Beija transformou a
minha vida num inferno! O que fiz foi monstruoso, reconheço. Mas se
vingou de mim, ponto por ponto, virgula por vírgula!
PERDIZES: O que ela fez?
Continua...
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No capítulo anterior...
Perdizes se espanta ao saber que Beija era a amante de Motta
O Ouvidor relembra como conheceu sua amada
Revela também porque Beija o odeia tanto
Motta conta que a amante se vingou dele de diversas formas
Perdizes fica curioso para saber como Beija se vingou
CAP. 98
MOTTA: Beija se vingou de mim tocando naquilo que um homem tem de mais sagrado: a sua honra, a sua reputação.
Nesse
instante Chalaça, que está chegando para falar com o Visconde, ouve o
nome “Beija” e se esconde para ouvir a conversa. Motta e Perdizes
conversam na parte elevada da varanda e sequer percebem a presença do
estranho.
MOTTA (olho
fixo no horizonte, relembrando): Nos primeiros dias Beija parecia um
bichinho acuado, tímido, desconfiado... Mas com o passar do tempo foi
ganhando confiança e se tornando senhora da situação.
PERDIZES: Mas que problemas lhe causou?
MOTTA:
Chifres, Perdizes, galhadas, desonra, humilhações... Não perdia uma
oportunidade de me achincalhar na frente dos meus convidados, das
autoridades... Certa vez jantávamos eu e oito ou dez juízes. Beija
chegou no meio da sala, abriu sua camisola e se ofereceu para eles,
completamente nua... Dizia que dava seu corpo em troca de liberdade.
Queria que alguém a comprasse de mim, como se fosse uma escrava. Os
juízes ficaram eufóricos e fui obrigado a expulsá-los de minha casa no
braço...
PERDIZES (boquiaberto): Meu Deus!...
Chalaça também fica estupefato, mas aguça as orelhas para ouvir mais.
MOTTA:
Foram inúmeros jantares e almoços nos quais me humilhou na frente de
todos os convidados. Sempre fazendo questão de frisar as atrocidades que
havia cometido contra ela, da sua falta de liberdade e da vida de
luxúria que a obrigava a viver. E claro, todos ficavam do lado dela. Mas
esta não era a única forma de torturar-me...
PERDIZES: Ainda tinha outras? Céus!
MOTTA:
Sim, a pior delas: Beija começou a se deitar com os homens da região em
troca de dinheiro, ouro, jóias e pedras preciosas. Você bem sabe que o
cargo de Ouvidor exige muitas viagens, a gente passa mais tempo viajando
que de fato trabalhando... Enquanto estava fora Beija promovia saraus
no palacete e também recebia seus amantes. Por fim, homens vinham de
regiões longínquas do sertão e até se hospedavam na cidade à espera de
uma oportunidade de estar com ela...
PERDIZES: Como soube disso?
MOTTA:
Isso se tornou público e notório. A vila inteira sabia. Até alguns
serviçais do palacete se deitaram com Beija. Não foram poucas as vezes
que troquei sopapos com seus amantes que insistiam em me desafiar,
lançando piadas, anedotas e outras gracinhas. Ao mesmo tempo em que era
uma autoridade, me tornei um “corno”, um homem desacreditado, falado e
achincalhado pela vila inteira... Motivo de piada até de escravos...
PERDIZES: Mas, afinal de contas, porque suportou tudo isso sem tomar uma enérgica providência, homem?
Continua amanhã...
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